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Escritores negros debatem seu papel

23 mar 2010 - 19h34
(atualizado às 19h48)
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A 10ª Conferência Nacional dos Escritores Negros dos Estados Unidos começa na quinta-feira, no Medgar Evers College, em Nova York. A ocasião fez com que Walter Mosley recordasse a sua primeira participação no evento, em 1980. Ele era um dos diversos escritores ainda inéditos que compareceram à conferência daquele ano, conta. Um editor havia rejeitado seu primeiro romance, protagonizado pelo detetive Easy Rawlins, alegando que a editora já publicava uma série de mistério com um detetive negro.

"Terry McMillan disse que eu teria de vender livros por conta própria", ele recorda.

Mas na era do presidente Obama, há escritores negros de sucesso em diversos gêneros; uma delas, Toni Morrison, laureada com o Nobel de Literatura, foi contactada para servir como presidente honorária do evento. Por isso, será que os escritores negros ainda necessitam de um evento profissional separado?

Em entrevistas, muitos escritores e editores negros responderam afirmativamente. Os autores negros são parte da luta da sociedade mais ampla contra o legado da discriminação e exclusão, disseram, e muitas vezes necessitam de uma abordagem estratégica para conseguir que seu trabalho seja promovido, resenhado pelos veículos de mídia e vendido.

A conferência, que deve atrair dois mil participantes, é uma chance para que os escritores estudem e celebrem uns aos outros, e que os leitores os vejam apresentando seus trabalhos e discutindo temas sociais e literários. Em quatro dias de debates e oficinas, os participantes também poderão discutir temas como o valor das seções de literatura negra em livrarias, ao baixo número de editores negros no mercado de livros e como expandir a lista dos escritores negros utilizados como parte de currículos escolares.

"Se uma conferência de escritores negros continua necessária? Com certeza", disse Mosley, autor de dezenas de livros de todo tipo, especialmente depois de encerrar a série estrelada por Rawlins, que conquistou grande sucesso de vendas. "Os escritores negros ainda enfrentam toda espécie de questões sobre o mundo em que vivem e as batalhas que precisam enfrentar", afirmou. "Essa é uma chance para que prestemos atenção uns aos outros sem que precisemos levar em conta os valores da sociedade mais ampla".

Mas há pessoas no mundo editorial que se preocupam com a possibilidade de que os participantes falem apenas para si mesmos. "Respeito o trabalho de construção de uma comunidade que a conferência realiza", disse Martha Southgate, romancista cujo trabalho mais recente, Third Girl from the Left, foi publicado em 2005. "Mas o que me incomoda é que nós deveríamos estar falando para um mundo maior que a nossa comunidade".

Em 2007, Southgate integrou um grupo racialmente diversificado de escritores, profissionais editoriais e vendedores de livros que criou o site theringshout.com, dedicado a escritores negros e à ideia de que eles ocupam posição central na tradição literária dos Estados Unidos, atraindo todo tipo de leitores.

"Precisamos de mais interação", disse o produtor de cinema, roteirista e cineasta Lawrence Schiller. Schiller é branco, e convidou Brenda Greene, diretora da conferência e diretora executiva do Centro de Literatura Negra do Medgar Evers, a indicar um escritor negro que possa participar de um projeto de treinamento literário que ele organizou.

A conferência é um passo no sentido de tornar os escritores negros mais visíveis, disse Schiller, mas eles também precisam "ser parte do cenário mais amplo": conquistar maior representação em outras conferências, nos currículos de programas universitários de literatura e nas preferências de leitura de jovens de outras etnias.

Greene disse que a conferência, que ela acredita ser o maior evento do tipo nos Estados Unidos, ajuda a atingir esses objetivos.

"Estamos dando forma e ajudando a redefinir o que constitui literatura, e garantindo que nossas vozes sejam ouvidas", ela disse. "Sem essas conferências, nem mesmo se pode saber quem está por aí trabalhando", acrescentou, enfatizando que livrarias e escolas oferecem um elenco limitado de escritores negros.

A conferência multitemática também incluirá tributos a Amiri Baraka e Toni Cade Bambara, que morreu em 1995; debates sobre tópicos como "o escritor negro como ativista literário" e "política e sátira na literatura de escritores negros"; e sessões que exploram a influência de fenômenos como hip-hop, guerra e a Internet sobre os escritores negros. A conferência também incluirá oficinas de literatura para estudantes primários, secundários e superiores.

Além de Morrison, que será homenageada em uma recepção na noite de sábado, devem participar escritores como os romancistas Colson Whitehead, Bernice McFadden, Victor LaValle e Breena Clarke; as poetas Sonia Sanchez e Staceyann Chin; e autores que escrevem em mais de um gênero, tais como James McBride, Thulani Davis, Kevin Powell e Toure.

Walter Mosley relembrou sua participação na primeira edição da Conferência, em 1980
Walter Mosley relembrou sua participação na primeira edição da Conferência, em 1980
Foto: Getty Images
The New York Times
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