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Flip: Peter Burke teme pelo futuro do livro

5 ago 2010 - 21h36
(atualizado às 21h51)
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Isaac Ismar
Direto de Paraty

Simpático e extremamente atencioso com seus admiradores, o escritor inglês Peter Burke mostrou mais uma vez o carinho que tem pelo Brasil durante o segundo dia da 8ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), nesta quarta-feira (5). Momentos antes da palestra O Livro: Capítulo 1, onde falou sobre Gilberto Freyre e seus estudos da formação racial e cultural da sociedade brasileira, Peter demonstrou preocupação com o futuro dos livros impressos e o impacto que a leitura rápida e superficial pode gerar nas próximas gerações.

Escritor desde a década de 1960, autor de 30 livros - muitos deles publicados no Brasil -, ainda hoje, com tantos meios mais modernos de obter informações, ele não dispensa a leitura em sebos e bibliotecas públicas.

"Gosto do contato com o livro tradicional, com as folhas. Cresci nos sebos e adoro bibliotecas publicas e universitárias. Pertenço a este mundo. Acredito que os livros terão um papel menos importante no futuro porque serão substituídos pelos meios eletrônicos, mas continuarão a existir. Sempre haverá livros, pois as pessoas têm um jeito particular de ler. Uns de forma mais rápida e outros menos. Com o livro eletrônico (e-book) as pessoas lêem mais rápido. Fico preocupado se no futuro elas perderão o interesse por algo mais profundo. Hoje é difícil vender um livro de cem mil palavras", exemplificou Peter, que mesclou respostas em inglês e português.

A crise que afeta alguns jornais impressos que têm conteúdo na internet e a chegada e popularização dos livros eletrônicos também foram comentadas por Peter. Na opinião dele, os livros são mais ameaçados.

"Os jornais são adaptáveis a esse fenômeno. As pessoas da minha geração gostam de pegar nos jornais. Leio jornais na internet, mas quando o texto tem mais de 30 páginas, eu imprimo para ler. Não leio e-books. Gosto de marcar e escrever nos livros. Isso não é possível nos e-books. A minha preocupação é com o desaparecimento dos livros. É triste essa mudança pra mim. As próximas gerações não vão perceber isso. Meu filho ler menos do que eu", lamentou.

Ainda sobre o futuro dos livros, de acordo com Peter, o fato de atualmente as novas informações se tornarem antigas logo em seguida, tão pouco tempo depois, fará com que as obras se tornem menos profundas.

"Não quero escrever para ser lido daqui a 30 anos, pois sei que os livros serão menores e haverá menos lugares para guardá-los. As pessoas não terão interesse em ler obras mais complexas e longas", completou.

A popularização e a troca de informações nas redes sociais, de acordo com Peter, estão ajudando a formar um novo estilo de memória. Porém, ele faz um contraponto para a realidade brasileira.

"É certo que os meios criam um novo sentido para a memória. Nós achamos que lembramos de algo que aconteceu, mas essa memória está influenciada pelos livros, programas de televisão e inclusive a internet. Os meios funcionam como um tipo de memória oficial, mas há pessoas não-alfabetizadas que muitas vezes têm memórias melhores que as nossas e não dependem desses meios para isso", comparou.

Peter Burke é casado com uma brasileira, a escritora Maria Lúcia Pallares-Burke, com quem escreveu Repensando os trópicos: um retrato intelectual de Gilberto Freyre. Especialista em Idade Moderna, atualmente ele é professor da Universidade de Cambridge.

"É uma pena, mas no mundo acadêmico inglês, Gilberto Freyre não é conhecido. Quando se fala dele, algumas pessoas pensam que Gilberto pesquisou sobre analfabetismo no Brasil, o que não é verdade. Cerca de 500 cópias de um livro dele foram vendidas em inglês. Fiz isso porque acho que ele deve ser mais conhecido no exterior, mesmo depois de tanto tempo de morto. Infelizmente, o meio ambiente só piorou após o falecimento de Gilberto", constatou Peter Burke, que desenvolveu o projeto de pesquisa Duas crises de consciência histórica, no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, em 1994.

Peter Burke falou sobre o futuro do livro em Paraty
Peter Burke falou sobre o futuro do livro em Paraty
Foto: Isaac Ismar / Especial para Terra
Fonte: Especial para Terra
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