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Artistas resgatam as boas memórias da Turma da Mônica

18 ago 2010 - 14h48
(atualizado em 19/8/2010 às 16h53)
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Carol Almeida

Essa história começa em 2009 quando, planejando as homenagens aos 50 anos de carreira de Mauricio de Sousa, o jornalista e atual braço direito do artista-empresário, Sidney Gusman, fez algumas ligações e enviou e-mails para conseguir convencer 50 artistas, entre quadrinistas, cartunistas e caricaturistas, a criarem histórias ou apenas imagens em tributo à Turma da Mônica. O processo de convencimento não foi, exatamente, difícil. Entre os artistas, alguns "mestres" absolutos como Laerte e Angeli, redesenhando personagens que, não é errado dizer, fizeram e, de certa forma, ainda fazem parte da construção social do Brasil. O primeiro MSP 50 saiu então no mesmo ano de 2009, no tal cinqüentenário de labor. Um ano, outros 50 telefonemas e e-mails depois, Gusman repete a fórmula e lança agora MSP + 50.

O que poderia parecer uma tentativa saturada de redesenhar personagens e apostar duas vezes o mesmo número num jogo de roleta se desvela como mais uma agradável surpresa tanto para quem, um dia, já leu a Turma da Mônica, ou para quem é fã de uma boa história em quadrinhos ou, em alguns casos, de uma ilustração daquelas de encher os olhos. Claro, num montante de 50 histórias, assim como aconteceu com o primeiro livro, alguns artistas se sobressaem e alguns poucos não dão conta do recado. Mas de uma maneira geral, virar a página no MSP + 50 costuma ser uma experiência bem agradável, particularmente para aqueles que gostam de boas surpresas quando se trata da criação de imagens.

Em se falando nela, a imagem, a impressão que se tem ao folhear o primeiro e o segundo tributo à Turma da Mônica é de que, nessa mais recente edição, os artistas, já cientes do que havia sido feito no primeiro álbum, resolveram ousar mais no traço. A sensação é de que eles souberam, na maior parte das vezes, desatar qualquer ligação com a identidade visual da escola Mauricio de Sousa. Aliás, o que o MSP 50 tinha de tributo e reverência, o MSP + 50 tem de brincadeira com o universo criado pelos gibis da "turminha". Origens distintas, leituras completamente novas e desenhos que fazem você repensar o antes e o depois daqueles personagens. Alguns fãs mais radicais podem chamar isso de profanação, mas aqueles que realmente guardam da turminha memórias com cheiro e sabor próprios vão perceber nesses novos desenhos o traço de quem, assim como muitos, entende a essência que constrói a relação de familiaridade do brasileiro com aquelas crianças.

A citar então dois artistas que fariam um favor imenso aos fãs da Turma da Mônica se colocassem à disposição uma versão em alta definição de seus dois desenhos, imagens daquelas que você pode emoldurar e pendurar na parede mais nobre de sua casa. São eles: Rafael Grampá, com um pôster incrível da turminha e do Jotalhão, e Tiago Hoisel com uma versão bem-humorada do Chico Bento, aqui numa criação 3D, técnica ainda pouco explorada pelos artistas brasileiros.

E se o MSP 50 começou com o pé direito ao colocar uma história sem balões de Laerte, o livro sequência se introduz com uma parceria no estilo nado sincronizado entre Mateus Santolouco, Rafael Albuquerque e Eduardo Medeiros. O trio já trabalhou junto em vários projetos e, aqui, resolvem refazer toda a origem do quarteto protagonista - Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali - em três capítulos, cada um desenhado à parte pelos artistas. Os traços são bem distintos mas, curiosamente, há uma identidade bem forte que ata os três roteiros: a palheta de cores é exatamente a mesma. Curiosidade: eles não combinaram isso previamente, as cores simplesmente se costuraram naturalmente.

Desnecessário fazer um "faixa a faixa" do álbum, mas se é para citar os roteiros mais inventivos e, de fato, autorais, eis a lista dos artistas: Hector Salas, Marcatti (autor acostumado às tramas quase pornográficas que aqui freia sua libido em nome de um tributo bem legal ao Cascão), Pablo Mayer, Williandi (autor de uma poética homenagem ao clássico Little Nemo de Winsor McCay, um marco para a história dos quadrinhos), Allan Sieber (num muito bem sacado roteiro cujo ponto de vista é do coelhinho Sansão), Rafael Coutinho, Marcelo Braga, Caco Galhardo, Chico Zullo, J. Márcio Nicolosi e Romahs. Sem deixar de mencionar também aqueles que deram a alguns personagens lapidações completamente centradas numa proposta estética, como é o caso do Jotalhão de André Ducci, do Papa-Capim de João Lin, da Magali e Mingau de Kako e do Chico Bento de Marlon Tenório.

Leia os nomes acima, some a eles todos os demais artistas que estão neste e no livro anterior e se percebe que, muito além de ser uma homenagem às histórias em quadrinhos mais bem sucedidas do mercado brasileiro, MSP 50 e MSP + 50 são os dois produtos editoriais que, de fato, conseguem levar artistas nacionais a um público desacostumado a encarar HQ como coisa de gente grande. A maior parte dos nomes que assinam os roteiros e desenhos de ambos os álbuns é formada por autores que trabalham no mercado independente (por vezes obscuro) voltado, sobretudo, para o público adulto. Há até quem faça quadrinhos apenas como passatempo, como é o caso do dentista Williandi. Mérito, portanto, de Sidney Gusman, cuja rede de relacionamentos no campo é vasta.

É oportuno pontuar que algumas memórias nós guardamos porque não tem outro jeito e o espaço reservado para nossa experiência presente é pequeno demais para tudo que levamos do passado. Mas vez em quando, como exercício constante de tirar o pó das gavetas, abrimos páginas de álbuns encardidos para ninar as boas lembranças. A Turma da Mônica criada por Mauricio de Sousa nos anos 1960 é um caso curioso nessa relação entre passado e presente. As histórias da chamada "turminha" fazem parte de uma memória coletiva nacional. Ao mesmo tempo, ainda que não mais com o mesmo impacto, elas ainda nutrem o presente de várias crianças e adolescentes que, geração após geração, são apresentados a Mônica, Cebolinha, Cascão, Magali, Chico Bento e companhia.

Os dois álbuns editados por Gusman servem para nos fazer abrir gavetas onde guardamos artefatos de nossa memória afetiva, bem como nos estimula a descobrir portas para novos artistas que, de outra forma, dificilmente chegariam a um público tão vasto como é aquele formado pelos fãs e colecionadores da Turma da Mônica. Criados por Mauricio de Sousa e constantemente desenhados e repensados por vários outros artistas de sua empresa, os personagens daqueles gibis parecem ter uma invertida relação de maternidade e paternidade sobre seus admiradores. Ou, nas palavras de outra famosa criança da literatura: "Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas."

MSP + 50 - Editora Panini. Preço: R$ 98 com capa dura e R$ 59 com capa cartonada

Jotalhão e a turminha no traço de Rafael Grampá
Jotalhão e a turminha no traço de Rafael Grampá
Foto: Divulgação
Fonte: Redação Terra
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