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No Brasil, Sasha Grey diz: "a pornografia está morrendo"

Em entrevista ao Terra, lendária atriz pornô fala sobre seu primeiro livro, como se afastou da indústria pornô e afirma que ainda crê no amor

23 ago 2013 - 14h02
(atualizado às 20h17)
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Uma das atrizes mais audaciosas da indústria pornô, de 2006 a 2011, Sasha Grey veio ao Brasil para lançar seu primeiro romance erótico, 'Juliette Society', que conta a história de uma universitária que se envolve com uma fraternidade sexual
Uma das atrizes mais audaciosas da indústria pornô, de 2006 a 2011, Sasha Grey veio ao Brasil para lançar seu primeiro romance erótico, 'Juliette Society', que conta a história de uma universitária que se envolve com uma fraternidade sexual
Foto: Bruno Santos / Terra

Sasha Grey não é mais aquela garota que grita – e faz – sacanagens. Entre 2006 e 2011, emplacou 271 filmes pornôs e ganhou o status como uma das atrizes mais audaciosas da indústria e lotou sua prateleira de prêmios, como o de melhor cena de sexo grupal, oral e outros ainda mais hardcore. Aos 25 anos, com o cabelo curto e roupas mais comportadas, a norte-americana deixou tudo isso de lado para se dedicar ao que jovens com certo talento querem fazer pelo resto da vida: projetos artísticos. O mais recente deles é o romance Juliette Society, seu primeiro livro erótico, que a trouxe ao Brasil para uma bateria de eventos e entrevistas com diversos veículos brasileiros nesta semana.

Mas nem tudo está perdido no mundo dos sonhos com Sasha. Ela continua libidinosa e sensual, mas agora por meio das palavras e pensamentos de Catherine, uma jovem universitária que acaba se envolvendo em uma fraternidade totalmente sexual. “Há muitas coisas que coloquei no livro sobre minha própria experiência. Mas também há histórias muito mais selvagens do que as minhas, que ouvi de pessoas que conheci, histórias que li ou assisti”, disse em entrevista exclusiva ao Terra, em uma grande varanda de um hotel luxuoso de São Paulo, com direito a um belo dia ensolarado. Cenário perfeito para qualquer filme adulto com ela,  como aqueles olhos penetrantes e sua sobrancelha sensualmente curvilínea fazem você imaginar no primeiro momento em que a encontra – esperando, toda simpática e aberta, para conversar sobre literatura.

Marina Ann Hantzis, seu nome verdadeiro, não acredita mais na força do pornô e, depois de quebrar com sua produtora de filmes eróticos, os livros são seu principal meio de despertar emoções – para o leitor e para ela mesma. “Sabe, a música, os filmes, a pornografia, todas essas coisas estão morrendo em termos de sua estrutura tradicional. As pessoas estão confusas e não sabem o que fazer. Porém, os livros não estão mortos. É algo que sempre vai estar por aí e isso me dá esperança”, explica a atriz e escritora, que se diz sortuda de conseguir se expressar por uma forma de arte mais “prestigiosa”.

Uma das atrizes mais audaciosas da indústria pornô, de 2006 a 2011, Sasha Grey veio ao Brasil para lançar seu primeiro romance erótico, 'Juliette Society', que conta a história de uma universitária que se envolve com uma fraternidade sexual
Uma das atrizes mais audaciosas da indústria pornô, de 2006 a 2011, Sasha Grey veio ao Brasil para lançar seu primeiro romance erótico, 'Juliette Society', que conta a história de uma universitária que se envolve com uma fraternidade sexual
Foto: Bruno Santos / Terra

Sempre disposta a responder da maneira mais direta possível, Sasha ainda conversou sobre o papel da mulher na sociedade opressora, como se protege de ameaças que sua antiga carreira lhe impôs, sobre artes, dinheiro e, é claro, seu próximos projetos. Confira a entrevista completa abaixo:     

Terra - Como você teve a ideia do enredo de Juliette Society?

Sasha Grey - Eu percebi que não tinha nenhum romance contemporâneo com o qual poderia me identificar. E em todos eles, as personagens mulheres eram tão inocentes sexualmente, sabe, mulheres que estão procurando pelo senhor “cara certo”. Então eu achei que tinha algo faltando e eu estava disposta ao desafio: eu queria provar para mim mesmo que era capaz de escrever algo diferente e também algo que fizesse jus aos romances clássicos.  

Terra - E quanto de sua própria experiência de vida – não só na indústria pornô – você colocou na protagonista Catherine?

Sasha Grey - Meu amor por filmes é a grande força. É onde eu mais me identifico com Catherine. Nós nos parecemos porque somos jovens, estudamos cinema e nós duas temos fantasias e desejos que não sabíamos como extravasar. Eu fiz filmes pornôs e Catherine, ao contrário, encontra uma melhor amiga na faculdade e as duas desenvolvem essa obsessão pelo professor, que é elevada pelo fato de que ele é de uma fraternidade. Isso é bem diferente do passado que eu escolhi. Nós somos bem diferentes em relação as nossas ideias sobre o amor, mas também somos bem conscientes em relação às decisões que tomamos. Nós vamos lá e fazemos.

Terra -  Então você acredita no amor? O que é amor para você?

Sasha Grey - 

Absolutamente. Eu acredito no amor, não sou tão cínica em relação a ele. Amor é vida!

Terra - Filmes pornôs são muito mais explícitos do que livros eróticos na maneira como mostram o que é sexo. O livro trabalha com o imaginário, com o sensorial mas sem ter contato físico. Você foi conhecida por fazer filmes pornôs bem hardcore. Para escrever o livro, você teve que rever seu modo de pensar sobre sexo?

Sasha Grey - Não mesmo. Porque assistir filmes pornôs é uma estimulação visual e, mesmo que seja pesado e sujo, nada pode-se comparar com o trabalho escrito. Acho que você consegue retratar mais na escrita, e sua imaginação pode te levar a lugares que nunca levaria se você apenas assistisse – porque está tudo lá na sua frente, é facilmente digerido, está bem na sua cara. Agora, estou empolgada para ver o que consigo fazer com isso! (risos)

Terra - E já descobriu algo?

Sasha Grey - 

Há muitas coisas que coloquei no livro sobre minha própria experiência. Mas também há histórias muito mais selvagens do que as minhas, que ouvi de pessoas que conheci, histórias que li ou assisti. Então há muitas influências externas que me inspiraram para escrever esse livro.    

Terra - E qual foi o objetivo de escrever esse livro? Você escreveu para preencher uma vontade sua ou você realmente quer tornar isso algo constante?

Sasha Grey - 

Sim, quero fazer mais disso. Foi muito legal escrevê-lo e me sinto muito gratificada que finalmente tenho algo para as pessoas curtirem. Pode não ser um filme, mas desta maneira eu tenho controle de tudo, sem ninguém ficar editando-o ou influenciando de fora. Eu me sinto muito sortuda de ser capaz de escrever um romance, porque normalmente isso tem mais prestígio do que outras formas de arte. É bom saber que ainda há um mundo onde posso criar minha própria história e personagens.

Terra - E você é daquela máxima ‘escreva bêbado, edite sóbrio’?

Sasha Grey - 

(Risos) Sabe, um pouco de bebedeira é OK, não é uma coisa ruim. Mas eu não gosto de ficar completamente bêbada, porque senão eu me distraio. E foram muitas noites gastas com isso. Em um certo momento, eu fui gravar um filme na Espanha, então tive que conciliar as duas coisas. O processo todo foi completamente insano e intimidador, porque a gente filmou muita coisa de noite também.  

Terra -  O livro já teve seus direitos de publicação comprados para uma adaptação cinematográfica. Você já pensava em transformá-lo em filme?

Sasha Grey - 

Não foi algo que eu necessariamente fiquei pensando, mas é bem empolgante saber que isso pode levar mais pessoas a conhecerem a história. Mas não pensei nisso. Acho que iria ficar com muito medo se isso tivesse sido combinado durante o processo.

Terra - E quem você gostaria que estrelasse o filme?

Sasha Grey - 

Uma das minhas primeiras escolhas seria Mia Wasikowska.

Terra - O livro fala sobre a liberdade das mulheres em conversarem abertamente sobre sexo. Mas no Egito as mulheres têm sido constantemente estupradas apenas por estarem protestando contra um sistema opressor. Qual é o papel da mulher na briga por mudanças em sociedades como essas?

Sasha Grey - 

A internet é uma arma muito poderosa porque estamos muito conectados; é globalização 2.0 no seu máximo. Eu acho maravilhoso que as mulheres são capazes de contar suas histórias, pedir ajuda e exigir mudanças. Na verdade, há um site muito bom, criado por Peter Gabriel, chamado Change.org, que lida com questões de direitos humanos pelo mundo. Eles são bem específicos no que querem fazer e como vão criar impacto sobre o problema, porque, normalmente, as pessoas esquecem-se do que aconteceu depois de um certo tempo. Para mim é a maneira mais poderosa de realmente criar e concretizar essas mudanças. Isso é muito inspirador e espero que as mulheres consigam cada vez mais ajuda.

Uma das atrizes mais audaciosas da indústria pornô, de 2006 a 2011, Sasha Grey veio ao Brasil para lançar seu primeiro romance erótico, 'Juliette Society', que conta a história de uma universitária que se envolve com uma fraternidade sexual
Uma das atrizes mais audaciosas da indústria pornô, de 2006 a 2011, Sasha Grey veio ao Brasil para lançar seu primeiro romance erótico, 'Juliette Society', que conta a história de uma universitária que se envolve com uma fraternidade sexual
Foto: Bruno Santos / Terra
Terra - E você faz algo para conscientizar as pessoas?

Sasha Grey - 

Sim. Quando fãs me comunicam, pode ser uma coisa pequena, como ‘ei, por favor, você pode falar sobre esse movimento, escrever sobre isso no Twitter ou Facebook?’, eu tento ajudar. Sabe, um pequeno gesto pode tornar as coisas maiores. Eu sempre tento falar sobre mudanças de ordem quando posso.         

Terra - E como você se protege de ameaças das pessoas?

Sasha Grey - 

Na internet você nunca vai conseguir se proteger. Não importa quem você é ou o que tenha feito, não há proteção. Isso é a internet, o velho oeste, a terra de ninguém. Realmente não há nenhum nível de controle. Pessoalmente a coisa muda, porque é real. É um problema real. Eu tomei preocupações para me proteger da maneira mais segura. Eu tento não colocar minha família e minha vida privada em situações de estresse, assim eu consigo manter as pessoas que amo protegidas de pessoas que não gostam do que faço.

Terra - Que tipo de fã você tem?

Sasha Grey - 

A maioria dos meus fãs é incrível! As pessoas têm essa ideia de que só porque fiz filmes pornôs elas têm o direito de dizer o que querem, porque me viram pelada. Mas é praticamente o oposto. As pessoas ficam mais respeitosas quando estão do meu lado, porque talvez elas ficam intimidadas que eu saiba que eles assistem pornô (risos). Mas sim, meus fãs são incríveis, me apoiam desde que anunciei que pararia de fazer pornô. Há sempre maçãs estragadas no cesto, mas esses não são meus fãs.

Terra - Você disse em outra entrevista que não para de pensar em projetos artísticos, mas quando o assunto é dinheiro você falhou. Você acha que quando tem dinheiro na parada a arte se diminui?

Sasha Grey - 

Não mesmo, porque sempre existiram mecenas que ajudam artistas a realizarem seus sonhos. Mas ao mesmo tempo, o mundo está tão pequeno hoje que as artes têm criado estrelas, como estrelas do cinema, porque precisa-se mercantilizar em cima para sobreviver. É claro que há o lado bom e o lado ruim. Mas não acho que só porque o projeto é patrocinado, seja uma escultura, pintura, filme ou música, ele perde seu valor ou autenticidade.  

Terra - E por que você acha que faliu com sua produtora de filmes pornô?

Sasha Grey - 

Eu quebrei porque fiz negócio com alguém que não concordava comigo.

Terra - Foi isso que te fez parar de fazer filmes pornográficos?

Sasha Grey - 

Sim. Eu comecei a empresa porque senti que tinha conquistado tudo que queria como performer. Então não fazia sentido eu continuar trabalhando para outras pessoas, eu queria fazer minhas próprias coisas, meus próprios filmes. Quando a empresa quebrou, eu realmente tive que fazer uma escolha: devo começar outro empreendimento tudo de novo – e eu estava dormindo três horas por dia, ralando minha bunda, literal e figurativamente (risos) – ou aceitar essas ofertas de fazer filmes e TV, e ser séria e dedicar meu tempo a isso? Porque era realmente impossível conciliar os dois.   

Terra - Você leu 50 Tons de Cinza? O que achou?

Sasha Grey - 

Eu li o primeiro livro. Não é o que gosto de ler, mas eu acho que é importante por permitir uma grande conversa e diálogo sobre sadomasoquismo. Eu digo, sadomasoquismo é normalmente visto como abuso ou algo que torna as mulheres objeto, e isso é uma ideia que eu sempre tentei lutar contra. É um assunto muito controverso que as pessoas têm medo de falar, algo que muitas pessoas não entendem e nunca foi discutido em um nível tão popular, o que é uma coisa boa.

Terra - Você acha que há mulheres como a personagem principal, a Anastasia?

Sasha Grey - 

Não muito. Acho que elas estão mesmo na fantasia.      

Terra - Você tinha uma banda, o aTelecine. O que aconteceu?

Uma das atrizes mais audaciosas da indústria pornô, de 2006 a 2011, Sasha Grey veio ao Brasil para lançar seu primeiro romance erótico, 'Juliette Society', que conta a história de uma universitária que se envolve com uma fraternidade sexual
Uma das atrizes mais audaciosas da indústria pornô, de 2006 a 2011, Sasha Grey veio ao Brasil para lançar seu primeiro romance erótico, 'Juliette Society', que conta a história de uma universitária que se envolve com uma fraternidade sexual
Foto: Bruno Santos / Terra

Sasha Grey - 

Eu montei a banda com meu ex, então... é hora de começar outra coisa. Mas eu tenho conversado com amigos para montar outro projeto, que eu ainda não sei o que será. Mas a coisa que amo sobre música, a direção que eu sempre quis levar é algo que possa fazer quando estiver com tempo. Não quero sentir isso como um trabalho. Não quero ter que preencher a expectativa de alguém, porque já faço isso no resto da minha vida artística.

Terra - Você veio ao Brasil também para discotecar. O que você toca normalmente?

Sasha Grey - 

Sim, essa foi outra razão que foi difícil me focar em fazer minha própria música porque passei muito tempo viajando e discotecando. Passei de fevereiro a junho viajando, da Indonésia até toda Europa e de volta a Los Angeles para discotecar. Mas há uma diferença do que gosto de tocar e o que toco normalmente! (risos)

Terra - Eu vi um vídeo uma vez que você mostra os discos que tem em casa e um deles era do Stooges. O que você tem escutado?

Sasha Grey - 

Sim, Stooges é incrível! É engraçado, mas não tenho escutado muitos artistas novos. O novo do Depeche Mode e o novo do David Bowie são muito bons.

Terra - E sobre filmes? Quer continuar a atuar, talvez dirigir?

Sasha Grey - 

Quero continuar a atuar. Eu acabei de terminar um filme em dezembro,

Open Windows

, com Elijah Wood e dirigido por Nacho Vigalondo. Vamos ver, eu praticamente gastei o ano inteiro trabalhando no romance. Verei o que virá assim que eu tiver um tempo para descansar.

Terra - Você acredita que ainda precisa trabalhar? Ou agora você pode se dar o prazer de só tentar projetos e coisas que lhe deem prazer?

Sasha Grey - 

Humm... não sei. Eu quero realmente ver as pessoas gostando de

Juliette Society

e eu quero continuar a escrever. Isso parece ser o momento mais estável que eu já tive em minha carreira há um tempo, e é legal ter pessoas acreditando nisso. Sabe, a música, os filmes, a pornografia, todas essas coisas estão morrendo em termos de sua estrutura tradicional. As pessoas estão confusas e não sabem o que fazer. Não há mais meio termo. Porém, os livros não estão mortos. É algo que sempre vai estar por aí e isso me dá esperança.

Terra - Que tal abrir uma editora de livros?

Sasha Grey - 

Não, vou ficar com a escrita mesmo! (risos)   

Fonte: Terra
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