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Novelas se inspiram na realidade e mostram a violência contra a mulher

26 ago 2011 - 10h25
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MARIANA TRIGO

Volta e meia a teledramaturgia pincela as tramas com escoriações e hematomas em personagens femininos. São situações que mostram a dura realidade da violência contra a mulher. Os vilões, em geral, são psicopatas, agressivos e sempre repugnantes, quase nunca mostrados como na realidade, muitas vezes pais exemplares de família, aparentemente perfeitos perante à sociedade. No entanto, ainda tem sido habitual a abordagem de personagens que, apesar de agredidas por seus companheiros, continuam alimentando a impunidade através do silêncio.

Este é um panorama muito comum nesse tipo de agressão, que passou a ser mais severamente punida desde 2006, com a Lei Maria da Penha - que alterou o Código Penal Brasileiro permitindo a prisão em flagrante ou prisão preventiva decretada e não mais punições com penas alternativas. Mesmo assim, os autores da teledramaturgia continuam alertando, através de suas personagens, que nem mesmo diante dessa proteção legal, as mulheres buscam ajuda. É o caso de Celeste, vivida por Dira Paes em Fina Estampa. A personagem leva surras constantes do violento Baltazar, de Alexandre Nero. E, mesmo assim, não o denuncia. "Isso existe em todas as classes sociais. Ela convive com a dor e o amor. Esse romantismo a imobiliza e a deixa confusa sobre denunciar ou não esse homem", avalia Dira.

Já Aguinaldo Silva, autor da trama, que também já abordou o tema em outras novelas, como Senhora do Destino - quando Rita de Cássia, de Adriana Lessa, apanhava do fortão Cigano, de Ronnie Marruda -, e em Duas Caras - em que Dália, de Leona Cavalli, que era viciada em drogas, apanhava do marido Ronildo, de Rodrigo Hilbert -, faz questão de tratar desta temática social em suas histórias. "Em Fina Estampa quero discutir por que a mulher se submete, por que ela continua tão servil? Por que ela não faz nada e deixa o homem continuar batendo?", questiona Aguinaldo.

O mesmo tem acontecido com a sofrida Lavínia, de Nívea Stelmann, de Morde & Assopra. Depois que se envolveu com Oséas, de Luiz Mello, ela começou a ser espancada na história. Para Nívea, muitas mulheres nem assumem que apanham por pura vergonha e por dependerem financeiramente dos maridos. Já em Vidas em Jogo, da Record, a situação dramática se repete. A dedicada Zizi, de Lucinha Lins, volta e meia leva surras do marido Adalberto, interpretado por Luiz Guilherme. Tanto que, depois de ser brutalmente agredida e ir parar no hospital, finalmente decidiu se abrir com a amiga Augusta, de Denise Del Vecchio. "Tanto essas personagens como essas mulheres têm de se convencer que buscar ajuda e denunciar é necessário. As pessoas prometem que vão mudar, mas as agressões se repetem", alerta a atriz.

A produção que começou a mostrar a fundo esta questão na teledramaturgia foi a minissérie Quem Ama Não Mata, exibida em 1982 e dirigida por Daniel Filho e Dennis Carvalho. Ela contava a história de cinco casais distintos que viviam situações problemáticas em seus casamentos. Quase uma década depois, o seriado Delegacia de Mulheres, de Maria Carmem Barbosa, exibido pela Globo em 1990, voltou a abordar o tema. A trama, dirigida por Wolf Maya, Denise Saraceni e Del Rangel, mostrava o dia a dia de uma delegacia feminina e os casos de violência contra a mulher. Mas a série acabou provocando protestos por parte das funcionárias das delegacias cariocas e paulistas, que acharam que o programa abordava algumas histórias com um tom de comédia, o que não é indicado para o tema. "A ideia não era mostrar um monte de ocorrências, mas também apresentar a vida de mulheres que trabalhavam em uma delegacia, como se comportavam, como se relacionavam", lembra Wolf.

Assim como na realidade, a ficção muitas vezes retrata que, em grande parte dos casos desse tipo de violência, os homens se tornam agressivos pelo uso abusivo do álcool - seguido do ciúme - e que as mulheres levam, em média, até 10 anos para procurar ajuda e denunciar seus algozes. Em A Favorita, de João Emanuel Carneiro, Catarina, personagem de Lilia Cabral, volta e meia levava sopapos do violento - e quase sempre embriagado - Leonardo, de Jackson Antunes. "Ele não merecia perdão. Casos como esse deveriam pegar prisão perpétua", frisa Jackson, que chegou a sofrer violência física na rua enquanto interpretava o malvadão.

Golpes quase fatais

Uma das tramas que mais chocou o país ao retratar a violência contra as mulheres foi Mulheres Apaixonadas, de Manoel Carlos. Ao som de gritos e imagens que só mostravam o cenário da casa de Raquel, interpretada por Helena Ranaldi, a personagem sofria nas mãos do psicopata Marcos, do então estreante em novelas Dan Stulbach. Embalados pela voz rouca de Norah Jones na trilha sonora e pelos murmúrios de dor da personagem Raquel, o casal foi um dos mais marcantes ao retratar a agressividade doméstica. "Tinha cenas que eu acabava de gravar com o Dan e a gente falava: 'nossa!'. Chegava em casa arrasada, com o corpo cansado, uma energia pesada. Hoje sei separar bem essas emoções", lembra Helena Ranaldi.

Para Dan Stulbach, o peso de viver um personagem agressor foi ainda maior por ser um ator estreante na tevê e o público não ter referências anteriores de outros personagens. Segundo ele, o mais difícil foi lidar com o público em situações simples do cotidiano após as cenas mais brutais serem exibidas. "Uma vez cheguei para tomar café da manhã em um hotel e todas as mulheres se levantaram e foram embora. Passaram a não me atender em restaurantes, em lojas, me tratavam mal. Não sentavam do meu lado em avião. Mas ganhei 14 prêmios com esse personagem", lembra.

Em 'Fina Estampa', Celeste, interpretada por Dira Paes, sofrerá violência doméstica
Em 'Fina Estampa', Celeste, interpretada por Dira Paes, sofrerá violência doméstica
Foto: TV Globo / Divulgação
Fonte: TV Press
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