PUBLICIDADE

Americanos 'vestem' obra icônica da brasileira Lygia Pape pelas ruas de NY

29 mar 2017 - 11h35
(atualizado às 16h16)
Compartilhar
Exibir comentários
Foto: @Lygia.Pape/Facebook / Reprodução

Smartphones, selfies e um cenário mais cinza que o de uma favela no Rio de Janeiro em 1968 separam a primeira edição de Divisor, performance criada pela artista multimídia Lygia Pape, e sua mais nova versão, registrada no último sábado em Nova York.

Nova-iorquinos sobem 5ª Avenida vestindo 'escultura social' de Lygia Pape:

Imersos em um lençol imitando uma tela branca de 30 por 30 metros, dezenas de rostos de todas as idades sorriem, brincam e circulam juntos, numa experiência coletiva que implode o muro que tradicionalmente separa artista, obra e espectador.

A reedição da performance é parte da exposição Lygia Pape: A multitude of Forms ("Uma multidão de formas", em tradução literal), primeira grande retrospectiva da artista nos EUA, no museu Met Breuer, "braço" do Metropolitan de Nova York dedicado a arte contemporânea.

Obra atravessou coração de Nova York, entre o Met Breuer e o Metropolitan Museum of Art
Obra atravessou coração de Nova York, entre o Met Breuer e o Metropolitan Museum of Art
Foto: @Lygia.Pape/Facebook / Reprodução

"No começo, ninguém sabia direito o que era, porque uma coisa é ver foto e filmagem, e outra é experimentar ao vivo", disse à BBC Brasil Paula Pape, filha da artista, que foi a Nova York acompanhar a performance.

"Mas quando começaram a andar e entraram na 5ª avenida, as pessoas realmente começaram a entender como funciona aquilo, aquele conjunto onde é preciso negociar entre si para fazer curvas e entrar em acordos e em sintonia para seguir a mesma direção harmonicamente."

Escultura social

Colega de Hélio Oiticica, Lygia Clark e Ferreira Gullar, Lygia Pape, é uma das representantes de um importante momento de ruptura nas artes brasileiras.

No início dos anos 1960, artistas que não se sentiam mais representados pelos quadros e esculturas da arte tradicional decidiram misturar os espaços antes dedicados a artista e observador.

Assim nasciam, por exemplo, os parangolés de Oiticica - uma espécie de capa que só mostrava seu desenho e forma quando vestida por alguém em movimento, dançando.

'Eram 60 pessoas ou mais, entre estudantes, professores, gente ligada a arte e gente que não tinha nada a ver com arte, todos unidos...'
'Eram 60 pessoas ou mais, entre estudantes, professores, gente ligada a arte e gente que não tinha nada a ver com arte, todos unidos...'
Foto: @Lygia.Pape/Facebook / Reprodução

No mesmo contexto surgiu o Divisor, também classificado por Lygia como "escultura social" e agora reeditado nos Estados Unidos.

A performance foi realizada por Pape pela primeira vez em uma favela do Rio de Janeiro. Em entrevista à filha Cristina, em 2002, a artista descreveu o acontecimento:

"Divisor, quando eu fiz, foi muito interessante. No final da minha rua, que é sem saída, há um rio, uma pequena ladeira e havia uma favelinha. Eu fiz o primeiro e não sabia muito bem como ia mostrar para as pessoas, então eu o abri na ladeira, espalhei pelo chão, que não tinha objetos interferentes. Ficou muito bonito com a projeção da mata sobre ele. Aos poucos as crianças da favela começaram a pular em cima do pano, escorregar sobre ele, acharam uma brincadeira fantástica até que um levantou uma ponta do pano e descobriu uma fenda, enfiou a cabeça nela e imediatamente a criançada toda fez isso. E começaram a descer a ladeira, todos enfiados, com as cabecinhas dentro do divisor."

Foto: @Lygia.Pape/Facebook / Reprodução

Pape morreu em 2004, depois de apresentar a obra na China, na Espanha e em diferentes cidades brasileiras.

Nos Estados Unidos, a última performance Divisor foi realizada no início dos anos 2000 - "mas era um divisor muito pequenininho", lembra Paula Pape.

Reedição?

'Divisor' atravessou oito quadras no coração de Nova York
'Divisor' atravessou oito quadras no coração de Nova York
Foto: @Lygia.Pape/Facebook / Reprodução

A obra atravessou oito quadras no coração de Nova York, entre o Met Breuer e o Metropolitan Museum of Art.

"O sentimento foi muito forte. Eram 60 pessoas ou mais, entre estudantes, professores, gente ligada a arte e gente que não tinha nada a ver com arte, todos unidos", diz Paula Pape, sobre a experiência do último sábado.

"Todos são um só no Divisor. As pessoas se esquecem quem são e se levam pelo coletivo."

Pelo caminho, alguns curiosos se aproximavam para tentar encaixar suas cabeças em fendas sobressalentes, enquanto outras filmavam e fotografavam a performance sem muita certeza sobre o que acontecia.

"Talvez façamos de novo até o fim da exposição", diz Paula Pape com suspense. "O museu ficou muito satisfeito."

A exposição do Met Bouer reúne fotos, vídeos, esculturas, fotos e instalações da artista, nascida em Nova Friburgo, no Rio de Janeiro.

Lygia Pape: A multitude of Forms segue em cartaz em Nova York até 23 de junho.

Foto: @Lygia.Pape/Facebook / Reprodução
BBC News Brasil BBC News Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização escrita da BBC News Brasil.
Compartilhar
Publicidade
Publicidade