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Artista vira modelo em retratos de ancestrais de 5 gerações

17 fev 2017 - 16h07
(atualizado às 16h24)
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Fuchs (esq.) se interessa pelos antepassados desde pequeno - 'Conversava com os retratos deles, e talvez isso tenha me levado a essas reinterpretações'
Fuchs (esq.) se interessa pelos antepassados desde pequeno - 'Conversava com os retratos deles, e talvez isso tenha me levado a essas reinterpretações'
Foto: BBC News Brasil

O artista e fotógrafo Christian Fuchs, de 37 anos, vive em um elegante apartamento com vista para o mar no distrito boêmio de Barranco, em Lima.

As paredes são cobertas de quadros de seus ancestrais, que eram aristocratas europeus e latino-americanos. Um olhar mais atento, porém, revela algo inusitado: quem aparece em vários dos retratos é o próprio artista.

Tudo começou quando Fuchs tinha apenas 10 anos de idade. Nessa época, sua mãe foi diagnosticada com esquizofrenia e internada num hospital psiquiátrico, onde morreu cinco anos mais tarde. O pai, por sua vez, abandonou a família, casou-se de novo e sumiu.

Diante disso, ele, o irmão e a irmã foram criados pelos avós paternos.

"Cresci em meio a retratos e objetos que estão na família há cinco gerações", diz. "Quando eu era criança, olhava para os retratos e brincava com eles. Quando não sabia os nomes dos personagens, eu inventava. Lembro que ficava olhando para eles por horas e sentia como se estivessem me olhando de volta", continua.

Fuchs (esq.) se transforma no marechal Juan Bautista Elespuru y Montes de Oca (dir.), que lutou na guerra da independência do Peru, entre 1811 e 1824
Fuchs (esq.) se transforma no marechal Juan Bautista Elespuru y Montes de Oca (dir.), que lutou na guerra da independência do Peru, entre 1811 e 1824
Foto: BBC News Brasil

"Falava com eles às vezes - e talvez isso tenha me levado a essas reinterpretações."

A avó de Fuchs, Catalina del Carmen Silva Schilling, teve um papel importante nisso. Nascida no Chile em uma família de ascendência alemã, ela também havia sido criada pelos avós.

"Ela me contava histórias dos nossos parentes no Chile e na Alemanha. E eu aprendi a ver as coisas pelos olhos dela", diz. "Era mágico. Ela me falava sobre pessoas como a bisavó dela, Marie Schencke, que veio da Alemanha. A família dela trouxe a iluminação elétrica para a cidade chilena de Osorno."

Anos mais tarde, Fuchs foi estudar Direito, mas exerceu a profissão de advogado apenas por poucos meses: largou tudo para viver como artista. E logo se pegou mais uma vez olhando para os retratos.

A primeira recriação de Fuchs (esq.), Luise Friederike Charlotte Eleanora Chee (dir.), a bisavó da sua avó. 'Fui ao cabeleireiro e fiz um penteado igual ao dela'
A primeira recriação de Fuchs (esq.), Luise Friederike Charlotte Eleanora Chee (dir.), a bisavó da sua avó. 'Fui ao cabeleireiro e fiz um penteado igual ao dela'
Foto: BBC News Brasil

Uma ideia inusitada

"Eu estava olhando para um dos retratos de 1830 de Eleanora, a bisavó da minha avó", conta. "E pensei: considerando que temos os mesmo genes, será que posso me parecer com ela?' Naquela tarde fui ao cabeleireiro e fiz um penteado igual, com cachos. Achava que a ideia era boa para um novo projeto".

Ele explica que o processo de incorporar os ancestrais pode demorar vários meses.

Fuchs lê cartas de família e conversa com outros parentes sobre eles. Também leva fotos dos retratos para um alfaiate, que tenta reproduzir as roupas - algumas do século 18 - o mais fielmente possível, e para um joalheiro que cria réplicas das joias.

Vestir-se de mulher pode ser especialmente difícil - o artista acha os antigos espartilhos muito desconfortáveis.

"É complicado porque tenho que me depilar", revela. "E sou muito peludo."

A maquiagem demora entre três e cinco horas para ficar pronta, dependendo do personagem que vai incorporar.

Este foi o trabalho mais difícil, recriar Carl Schilling (dir.) que trocou a Alemanha pelo Chile, onde viveu até a morte, aos 93 anos, em 1923
Este foi o trabalho mais difícil, recriar Carl Schilling (dir.) que trocou a Alemanha pelo Chile, onde viveu até a morte, aos 93 anos, em 1923
Foto: BBC News Brasil

Maior desafio

Fuchs conta que o mais difícil foi recriar "o patriarca da família", Carl Schilling, bisavô da sua avó, que chegou no Chile em 1850, com 19 anos, em um navio de imigrantes alemães.

"Ele foi para o sul do país, onde trabalhou como administrador da propriedade dos Buschmann, uma família aristocrata, e acabou se casando com a filha deles, Johanna", explica.

"Carl aprendeu a língua nativa para poder falar com os indígenas Mapuche e foi um dos fundadores da escola alemã em Osorno, um dos colégios alemães mais antigos do mundo."

Para se transformar nele, Fuchs deixou a barba crescer. Isso demorou mais de um ano e, quando ela finalmente estava grande o bastante para ser descolorida, ele teve uma forte reação alérgica aos produtos químicos.

Hexavó de Fuchs (esq.), Natividad Martinez de Pinillos Cacho y Lavalle era cunhada de Luis José de Orbegoso, presidente do Peru de 1833 a 1836
Hexavó de Fuchs (esq.), Natividad Martinez de Pinillos Cacho y Lavalle era cunhada de Luis José de Orbegoso, presidente do Peru de 1833 a 1836
Foto: BBC News Brasil

Fuchs diz que soube que a mudança tinha dado certo quando, numa ida ao banco, perguntaram se ele queria um lugar na fila para idosos.

Embora o resultado se pareça com uma pintura, os quadros mostram fotos digitais tiradas com uma iluminação muito forte, que torna a pele do artista bem pálida, como se fosse uma porcelana.

As fotos então são impressas sem brilho, em papel de algodão e, como toque final, recebem molduras de época.

Fuchs expõe e vende as obras para colecionadores de todo o mundo, mas garante que a ideia inicial do projeto era conectá-lo com seu passado.

"No começo, minha família achou que eu era esquisito. Mas agora eles gostam das telas, também querem saber mais sobre seus parentes", explica.

Fuchs (esq.) está se transformando em Dorothea Viehmann, antepassada que colaborou com os Irmãos Grimm
Fuchs (esq.) está se transformando em Dorothea Viehmann, antepassada que colaborou com os Irmãos Grimm
Foto: BBC News Brasil

Próxima obra

Hoje, Fuchs trabalha para se transformar em Dorothea Viehmann, que nasceu em Kassel, na Alemanha, em 1755.

Filha de um taberneiro, ela ouvia muitas histórias dos frequentadores da taberna do pai. Por meio do padre local, Dorothea conheceu os irmãos Grimm, de quem se tornaria colaboradora.

Os irmãos Jacob e Wilhelm Grimm se dedicaram ao registro escrito de fábulas e contos infantis que na época eram narrados oralmente. Eles são os autores de Chapeuzinho Vermelho, Cinderela, Branca de Neve, Rapunzel e João e Maria e outras.

Muitas das histórias de Dorothea foram mais tarde publicadas no segundo volume dos Contos de Fada dos Irmãos Grimm.

O hexavô de Fuchs (esq.), Eulogio Elespuru y Martinez de Pinillos (dir.), viveu em Paris durante muitos anos
O hexavô de Fuchs (esq.), Eulogio Elespuru y Martinez de Pinillos (dir.), viveu em Paris durante muitos anos
Foto: BBC News Brasil

Para que Fuchs fique parecido com seus ancestrais, o artista de maquiagem Juan Diego Peschiera aplica várias camadas de látex líquido em seu rosto.

"A parte mais difícil são os olhos", explica.

Fuchs recriou até agora 11 retratos e tem outros mais em mente, desta vez ultrapassando os limites familiares - personalidades como a rainha Elizabeth 1ª, Mary Stuart e William Shakespeare estão na lista.

Mas existe uma pessoa muito especial na qual o artista quer se transformar: sua avó, que morreu logo depois do último Natal.

"Vai ser muito difícil fazer justiça à beleza dela, mas quero tentar."

Com exceção da antepenúltima, todas as imagens são cortesia de Christian Fuchs.

Fuchs (esq.) recria os penteados, roupas e joias antigas; acima, ele personifica a tia-tataravó Benjamina Elespuru y Martinez de Pinillos
Fuchs (esq.) recria os penteados, roupas e joias antigas; acima, ele personifica a tia-tataravó Benjamina Elespuru y Martinez de Pinillos
Foto: BBC News Brasil
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