Há 20 anos morria Paulo Francis: “A televisão é diabólica”
Jornalista pagou caro por ter denunciado em 1996 o escândalo de corrupção na Petrobras
A Petrobras matou Paulo Francis. É o que pensam vários de seus amigos. O coração do jornalista não teria resistido à pressão de um processo milionário por calúnia e difamação movido por executivos da estatal.
Numa edição do ‘Manhattan Connection’, Francis disse – e repetiu – que membros da cúpula da empresa praticavam corrupção e desviavam dinheiro público para contas pessoais na Suíça.
Duas décadas depois de sua morte, ocorrida na sala de seu apartamento no East Side, em Nova York, o Brasil e o planeta assistem ao desenrolar do Petrolão, maior escândalo de corrupção da história do País.
É possível ouvir a gargalhada zombeteira de Paulo Francis. Ele não poderia imaginar melhor vingança para a própria morte.
Quem sabe repetisse uma de suas frases mais conhecidas: “Talvez o Brasil já tenha acabado e a gente não tenha se dado conta disso”.
Na Globo, onde estreou em 1981, o maior polemista da TV brasileira fazia comentários de política internacional no ‘Jornal Nacional’ e ‘Jornal da Globo’.
Integrou a primeira formação do ‘Manhattan Connection’ no GNT e, em 1996, passou a fazer entrevistas com personalidades para a GloboNews.
Francis chamava a televisão de “diabólica”. É dele uma das análises mais realistas e cruéis a respeito do veículo, publicada em sua coluna na Folha de S. Paulo, em janeiro de 1990.
“A televisão é a força mais subversiva da nossa sociedade, ainda que inconscientemente. Na televisão se veem riquezas e estilos de vida que o vulgo desconhecia, ou de que só ouvia falar, e que agora vê entrar na sua sala de estar. E a mística da televisão, do comercial, é que tudo é possível para todo mundo, um ledo engano e não menos leda ilusão. Mas os ‘nativos’ ficaram mais e mais indóceis com a televisão. Ficar rico sem responsabilidade de ganhar dinheiro é um sonho comum. A televisão o açula e fornece ingredientes físicos – a descrição visual minuciosa da riqueza – ao pé-rapado. E, como há uma enorme propaganda de que somos todos iguais, a realidade provoca ressentimento crescente nos que não têm o que querem.”
Nunca, antes nem depois de Francis, houve na TV um cronista com tanta personalidade e tão controverso.
Dono de estilo único, o carioca que um dia fora esquerdista trotskista e depois se transfigurou em aristocrata imperialista ainda é inigualável e insubstituível. O tempo só faz bem à sua imagem e conteúdo.
E o que Paulo Francis diria a respeito da programação atual da televisão brasileira?
“Não vi e não gostei.”